Castidade e amor, duas
palavras tão mal interpretadas nos dias de hoje. Castidade normalmente está
relacionada com repressão, falta de liberdade, puritanismo. E o amor muitas
vezes é confundido com paixão, sexo, sentimento espontâneo que não exige
esforço. Porém, existe uma íntima relação da castidade, entendida como a
capacidade de adiar a satisfação de um desejo, com o amor conjugal verdadeiro e
duradouro, que pode ser entendido como a capacidade de sacrificar a si mesmo
para o bem e a felicidade do outro.
A natureza humana é
tanto animal como espiritual. Possuímos corpo e espírito. O nosso corpo, para
se manter vivo, possui alguns instintos básicos, como se alimentar, descansar e
se reproduzir. O instinto sexual, portanto, faz parte da nossa natureza, porém,
ao contrário dos outros animais, que não tem espírito e por isso não tem a
capacidade de controlar seus instintos, deve ser conduzido para a realização
plena (corpo e espírito) e não apenas para a satisfação imediata do corpo.
Todos temos o anseio
por nos realizarmos, por sermos felizes e essa realização pessoal vai muito
além da realização de nossos instintos físicos. Não basta estarmos alimentados,
vestidos, descansados para nos sentirmos realizados. A realização espiritual do
ser humano só acontece na medida em que se sente útil, importante, que faz
diferença. E isso só se dá através dos relacionamentos que construímos durante
nossa vida. O ser humano é um ser que precisa se relacionar, não foi criado
para viver isolado.
O amor é a forma mais
sublime do relacionamento humano, pois vai muito além de querer bem o outro, ou
se alegrar com a companhia. O amor verdadeiro nos impulsiona a desejar fazer o
outro feliz e somente amando dessa forma, nos livrando do egoísmo que quer nos
aprisionar em nossos próprios desejos, é que nos sentimos realizados. Mas como
aprendemos a amar dessa forma?
Vamos falar aqui
especificamente do amor conjugal. Os outros tipos de amor (materno/paterno,
filial, de amizade, etc) também precisam sem aprendidos, mas a forma é um pouco
diferente e podemos falar disso em outro post. O amor não é instinto, precisa
ser ensinado e aprendido. O instinto relacionado ao amor conjugal é o da
atração para a satisfação do desejo sexual. Esse desejo sexual pode ser de três
tipos: “vênus”, “eros” e reprodutivo.
O desejo tipo “vênus” é
aquele mais animal, que quer o corpo do outro para a própria realização. Aqui
não importa a pessoa, com suas qualidades intelectuais e afetivas, apenas o seu
corpo. É o instinto mais primitivo.
O desejo tipo “eros” (ou cupido), é
o “filho de vênus”, ou seja, parte desse primeiro instinto que quer só o corpo,
para desejar também a alma, os sentimentos, os afetos. É a paixão, que envolve
a pessoa como um todo.
Porém, “vênus” e “eros”
ainda não estão completos, porque quando o relacionamento com a pessoa
ultrapassa a fase da paixão, amadurece e quer ver aquele sentimento prolongado
no tempo, através dos filhos. Assim, para chegarmos ao verdadeiro amor
conjugal, a pessoa precisa, através do uso da razão, saber administrar esses
três tipos do desejo sexual.
E é aqui que entra a
castidade. Qualquer instinto primário que é imediatamente satisfeito, gera um
certo repúdio para aquilo que o satisfez. Se estamos com muita fome e comemos
um enorme prato de feijoada, estando satisfeitos não conseguimos nem mais olhar
para o prato de comida. O mesmo acontece com o desejo “vênus”. Se a atração
pelo corpo é satisfeita logo com a relação sexual, o natural é que, em breve,
esse “corpo” que me satisfez me cause repulsa. E aí vou procurar outro corpo
que me satisfaça, entrando num ciclo vicioso que jamais irá me realizar
plenamente.
Adiar a satisfação do
desejo sexual gera o interesse pela pessoa e não só pelo corpo. A castidade faz
com que o instinto saia da fase puramente animal e se torne mais humano. O
interesse passa a ser para uma pessoa específica, essa que me atraiu
primeiramente pelo corpo, mas em virtude da castidade, fez com que me interessasse
também pelo espírito.
A castidade permite
ainda que a pessoa passe a considerar a satisfação do instinto sexual
reprodutivo, ou seja, ter filhos com a pessoa amada e ajuda os dois a
enxergarem que a forma mais adequada de satisfazer esse instinto é através do
casamento. O casamento é um compromisso assumido publicamente que deve garantir
a união daquele homem e daquela mulher, por toda a vida. Uma união exclusiva
que tem como finalidade o bem dos filhos.
Os filhos são a prova
que os dois se tornaram uma só carne. Com os filhos aprendemos a nos doar
totalmente para o outro, sem esperar nada em troca. Aprendemos a amar de
verdade, a nos sacrificarmos pelo bem do outro. Amando os filhos, aprendemos
cada dia a amar mais o cônjuge.
E esse amor verdadeiro
nasce da castidade. Sem a castidade, nos tornamos cada vez mais egoístas,
pensando apenas na própria realização, em usar o outro para o meu prazer. Essa
atitude a longo prazo (às vezes nem tão longo assim) traz frustação e
infelicidade. Ser casto não é ser reprimido. Ser casto é aprender a controlar
uma satisfação imediata tendo em vista a felicidade futura. Aprender a ser
casto é aprender a amar.
photo credit: taylormackenzie <a href="http://www.flickr.com/photos/34442610@N06/32526976670">Cupid's lunch break</a> via <a href="http://photopin.com">photopin</a> <a href="https://creativecommons.org/licenses/by-sa/2.0/">(license)</a>
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